Cotidiano.

       Sentada ali na varanda vejo você passar: cabelos ao vento, pele clara, olhos arredondados, meio alta e meia baixa, sorriso que me fascina, caminha como se estivesse em cima de algodões, delicadamente. Mas nunca me olha, nunca me nota.

             Ali na varanda nos imagino caminhando em uma praça qualquer, eu me forçando a relembrar pedaços de poesias para tentar te conquistar, e você descobrindo que minha memória é péssima. Eu elogiando o seu sorriso, e você delicadamente me dando um beijo em forma de agradecimento. Eu segurando a sua mão, tão de perto, que percebi que é mais clara do que eu imaginava. Seu coração acelera, e eu o escuto. Minha mão esfria, e você sorri . 

        Ali na varanda nos imagino em um bar qualquer, nos embriagando de nós. Eu prestando atenção na forma que você vira suas doses, na forma como o cigarro se encaixa em seus dedos, na forma como você me olha. Você prestando atenção no meu jeito desengonçado de te tragar, de te beber, de te olhar, de te desejar. A simetria estava presente entre a gente. Ali na varanda nos imagino um só. Imagino duas vidas se unindo, e formando outras vidas. Ali na varanda eu te imagino, eu te conserto e me desconserto. Eu faço a cena que eu quiser*. Ali na varanda nos imagino deitadas na grama da mesma praça onde fiz seu coração acelerar, olhando a lua quase cheia, brincando de contar estrelas. Brincando de construir uma vida.   

           Ali na varanda torço pra você olhar para o lado, e a sintonia no unir.

S.

*trecho: Só pro meu prazer, de Leoni.